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Piadinha machista não tem graça nenhuma e só aumenta a misoginia

Angélica Morango

27/08/2017 04h00

(Foto: Getty Images)

"Acho feio demais mulher bebendo na rua. E fumando também. Mulher fazendo essas coisas já é feio, no boteco então, Deus me livre! E você já reparou nas roupas? Uns paninhos que não escondem nada, mostram tudo!"

Eu não ouvi essa frase de um homem, mas de uma senhora. Uma mulher que amo muito: a minha avó. Ela é super moderna pra umas coisas. Aceitou minha condição sexual numa boa, foi ao meu casamento com outra mulher, recebe e trata com o maior carinho todos os meus amigos gays. Então eu não entendi esse comentário. Acho que pela educação machista que ela recebeu, às vezes rolam uns conflitos internos.

Se pensarmos bem, muita coisa mudou nos últimos 80 anos, que é a idade da dona Felicidade, minha avó. O conceito de sororidade, por exemplo.

Ao invés de julgar minha avó, eu busquei esclarecê-la. "Vó, mulheres bebendo e fumando na rua ou nos botecos é feio por quê? As pessoas precisam se divertir também, a vida já é muito dura pra ficarmos só no trabalho e dentro de casa. Deixa elas serem felizes! Eu também bebo nos botecos vestida em paninhos que não tampam nada e você não me ama menos por isso. Vamos deixar de preconceitozinho?", aconselhei.

Uma cultura alicerçada por décadas sobre os pilares da intolerância não é desconstruída assim, de uma hora para outra. E não sou o mais perfeito exemplar da pureza feminista, não. Outro dia fui bem infeliz num comentário – que eu achei que seria engraçado – sobre mulheres dirigirem mal. E o fiz para uma única pessoa que no mesmo instante me repreendeu de um jeito leve, mas que me fez pensar sobre quão incutido está o machismo em nós. Ouvimos e repetimos tanto certas estupidezes que elas parecem genuínas, naturais, mas não são!

Não estamos vivendo uma era chata do "politicamente correto". Não somos a "geração mimimi".

Acontece que quando propagamos piadinhas machistas ou fazemos comentários descabidos contribuímos para a misoginia e avalizamos a humilhação e a violação das mulheres. Muitas atrocidades foram passivamente permitidas ao longo da história da humanidade até que, sob muita luta, com muitos exemplos e especialmente muita educação, as coisas mudaram.

Precisamos acreditar que continuaremos evoluindo e fazer a nossa parte todos os dias, especialmente dentro de nós.

Sobre a autora

Ana Angélica Martins Marques, a Morango, é mineira de Uberlândia, jornalista, fotógrafa e DJ. É também autora do livro de contos Quebrando o Aquário. Passou pela décima edição do Big Brother Brasil e só foi eliminada porque transformou o temido quarto branco no maior cabaré que você respeita. É vegetariana e cuida de três filhos felinos: Lua, Dylan e Mike.

Sobre o blog

Um espaço para falar de amor, sexo, comportamento feminino e feminismo com leveza e humor. Tudo sob o olhar de uma mulher esperta, que gosta de mulheres tão espertas quanto ela!