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Morango

Por que preferimos dar desculpas esfarrapadas a dizer "não" logo de cara?

Angélica Morango

09/11/2017 04h00

 

É mais fácil dizer "sim" e ser dócil. "Não" é enfrentamento, desgaste.

É comum que a gente diga "sim" sem querer, mesmo com a absoluta certeza de um arrependimento imediato. Quem nunca aceitou um convite pra sair e quase na mesma hora começou a planejar a desculpa para furar? São cólicas, dores de cabeça e doenças intermináveis. Se precisar matar a bisavó que já morreu há 20 anos, matamos.

O curioso é que passear, ver gente, curtir bons drinks e ouvir música é bom. Na maioria das vezes. Em algumas é uma coisa pavorosa, angustiante. Dar uma volta e lidar com desconhecidos, sejam ambientes, pessoas ou situações é uma loteria, pode ser ótimo ou catastrófico.

Se nem em uma situação potencialmente boa, como um rolê, temos garantia de satisfação, o que dizer de circunstâncias mais tensas? Tudo bem acumular funções no trabalho sem ganhar a mais por isso? Emprestar R$ 2 mil para a prima? Passar o Réveillon na casa da sogra porque a namorada pediu, apesar de ter sonhado em curtir a virada na praia?

Expectativa x realidade

A sensação é parecida com a de estar naqueles programas de TV em que o candidato aos prêmios, fechado numa cabine sem ouvir nada, tem de responder apenas com "sim" ou "não" às perguntas do apresentador do lado de fora:

– Você quer trocar essa máquina de lavar 12 quilos por essa bicicleta velha sem rodas?

– Siiiiiiiim!!!

Dizer "não" aos pais é rebeldia. Aos chefes, insubordinação. Aos amigos e amores, pode causar mágoa.

O problema é que aceitar e concordar passivamente com tudo faz com que muitas vezes passemos por cima de nós mesmos, do que acreditamos e desejamos, para satisfazer outrem, e isso gera uma expectativa de reciprocidade que, quando não se realiza, frustra. Dizer "sim" pode abrir portas, "não" pode fechá-las e vice-versa. Que os "nãos" e "sins" que dissermos sejam, sempre que possível,  compatíveis com a nossa real vontade.

"Se a liberdade significa alguma coisa, será sobretudo o direito de dizer às outras pessoas o que elas não querem ouvir", cravou George Orwell no célebre "1984", livro que inspirou o programa Big Brother Brasil. Para o qual eu disse "sim", como vocês bem sabem.

Sobre a autora

Ana Angélica Martins Marques, a Morango, é mineira de Uberlândia, jornalista, fotógrafa e DJ. É também autora do livro de contos Quebrando o Aquário. Passou pela décima edição do Big Brother Brasil e só foi eliminada porque transformou o temido quarto branco no maior cabaré que você respeita. É vegetariana e cuida de três filhos felinos: Lua, Dylan e Mike.

Sobre o blog

Um espaço para falar de amor, sexo, comportamento feminino e feminismo com leveza e humor. Tudo sob o olhar de uma mulher esperta, que gosta de mulheres tão espertas quanto ela!