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Sabe o que quer dizer "rebuceteio"? A vida sapatônica é cheia deles

Angélica Morango

10/10/2017 04h00

Joana amava Teresa que amava Raimunda

que amava Maria que amava Joaquina que amava Lili

que não amava ninguém.

Joana foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,

Raimunda morreu de desastre, Maria ficou para tia,

Joaquina suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes

que não tinha entrado na história.

Sim, você conhece esse poema. É "Quadrilha", de Carlos Drummond de Andrade. Eu só adaptei alguns nomes e pronto! Temos um belo retrato da vida lésbica como ela é – nada muito diferente da vida hétero –, mas com alguns dilemas peculiares. Na verdade só faltou Lili ter traído J. Pinto Fernandes com Joana pra fecharmos a roda.

Com um termo bem menos pudico que quadrilha, apresento-lhe o rebuceteio. No dicionário informal ele figura como uma "corrente de relações em que lésbicas ficam umas com as outras". Essa frase deixa tudo parecendo uma franquia de Sodoma e Gomorra, mas não é bem assim.

Estamos falando de relações humanas, interpessoais e extremamente emocionais em que o sexo é consequência. Prefiro traduzir o "rebuceteio" como essa clássica e praticamente inevitável possibilidade de estar ou ter estado sexual ou romanticamente ligada a uma ou várias pessoas que continuam fazendo parte da sua vida. A vida sapatônica é cheia dessas questões…

É OK ficar ficar com a ex da amiga?

Se você estiver solteira e a sua amiga terminar o namoro, tudo bem ficar com a ex dela? Ok, se envolver com a ex ficante da sua ex namorada? Como é que fica o clima quando no passado você teve um lance com a atual da sua best friend? E sobre a sua namorada já ter transado com a sua amiga num tempo não muito remoto?

São alguns impasses que cedo ou tarde serão encarados por toda lésbica. A menos que na mais tenra idade, ainda na fase de girininha, cada uma conheça o amor da vida e elas se mudem pra uma ilha deserta nos confins da Terra e fiquem morando lá para sempre. Faltariam ilhas.

Vamos aos fatos: o mundo é grande, mas também é um ovinho. Não é difícil estar no Nordeste e ter amigos a milhares de quilômetros de distância no sul, no Canadá ou lá no Japão. Porque as pessoas viajam, mudam de cidade, fazem milhares de conexões pela internet e sempre são apresentadas a amigues de primes de vizinhes de colegues até que por fim cada pessoa acaba conectada a todo mundo. Todo mundo mesmo.

Existe uma teoria popular, na qual eu acredito e que já foi testada algumas vezes por sociólogos e pesquisadores, que diz que cada indivíduo está a no máximo seis graus de separação de qualquer outro ser humano do planeta. O que pode significar, em tese, que você está a seis pessoas da Angelina Jolie ou da Gal Gadot. Assim: um conhecido seu certamente tem um amigo que conhece um cara bem pica, que tem contato com uma mulher bastante influente, que conhece uma pessoa fodástica, que conhece outra que pode te apresentar sem problemas a qualquer uma dessas  beldades. Isso só não vai acontecer se uma dessas seis pessoas não tiver o menor interesse em te ajudar.

Menos Hollywood, mais Drummond

Voltando à nossa realidade menos hollywoodiana e mais drummondiana: "o mundo é grande e cabe nesta janela sobre o mar. O mar é grande e cabe na cama e no colchão de amar. O amor é grande e cabe no breve espaço de beijar". #suspirei

A diferença básica no fim de relacionamentos heterossexuais e homossexuais é que quando um casal hétero rompe é comum que os homens tenham seus brothers e as mulheres tenham suas migas a quem recorrer. Cada um vai para o seu lado, dão rolês separados, são apresentados a outras pessoas completamente diferentes. No caso dos relacionamentos homossexuais, salvo raras exceções, o grupo de amigos tende a ser o mesmo, as opções de lugares pra curtir são reduzidas e o círculo de pessoas interessantes disponíveis também.

Por fim, restam duas opções: ou se afastar dos amigos, dos rolês e de toda uma vida social ou digerir o término, praticar o desapego e lidar com o fato de que conviver com uma ex – ou várias – não é o fim do mundo.

(Foto: Getty Images)

Sobre a autora

Ana Angélica Martins Marques, a Morango, é mineira de Uberlândia, jornalista, fotógrafa e DJ. É também autora do livro de contos Quebrando o Aquário. Passou pela décima edição do Big Brother Brasil e só foi eliminada porque transformou o temido quarto branco no maior cabaré que você respeita. É vegetariana e cuida de três filhos felinos: Lua, Dylan e Mike.

Sobre o blog

Um espaço para falar de amor, sexo, comportamento feminino e feminismo com leveza e humor. Tudo sob o olhar de uma mulher esperta, que gosta de mulheres tão espertas quanto ela!