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Como alguém pode ter certeza de que é bissexual? Tendo

Universa

13/04/2018 04h00

Imagem: Getty Images

Será que sou bi? Como alguém pode ter certeza de que é bissexual? Já me fiz essas perguntas, afinal namorei alguns homens, entretanto, essas relações não eram exatamente por atração, mas conveniência.

Sou lésbica, mesmo. Biscoita. Fancha. Princesa da frota Siga Bem. Quando mencionei a conveniência de ter um relacionamento heterossexual – mesmo sem sê-lo –, me referi às "facilidades". Passear de mãos dadas, trocar carinhos na rua, levar para o almoço de domingo com a família, expor abertamente o romance nas redes sociais… Hoje, felizmente, isso é uma realidade para muitos casais homossexuais, mas dez, 20 anos atrás, durante a minha adolescência, o cenário era outro, bem mais hostil.

Antes, eu queria me encaixar nos padrões. Só depois entendi que os padrões não são imutáveis. No entanto, não se transformam "sozinhos". Informação e ação são ferramentas essenciais para a mudança.

Agora, por exemplo, com o intuito de desnudar a bissexualidade, ouvi quem entende do assunto: pessoas assumidamente bissexuais. Aqui, elas e eles abrem o jogo e rasgam o verbo.

"Achei que era hétero quase a vida toda. Depois da primeira vez com uma mulher, jurei que era bem sapatão e nunca mais ficaria com um homem. Aí apareceu um cara massa e acabei curtindo… Até hoje minha mãe – e não só ela – pergunta o que eu prefiro, como se eu pudesse colocar todas as mulheres em uma sacola, os homens em outra, e escolher qual das duas levar pra casa. Depende do que eu encontrar em cada pessoa. Já conheci mulheres incríveis e homens maravilhosos! Pra mim pouco importa se são homens, mulheres, cis ou trans. Importa se é ou não uma pessoa interessante, se me provoca curiosidade, se me diverte, se o cheiro é bom, se o beijo rola… Se me apaixono, me jogo inteira e aquela pessoa me basta!" Ivana, 29, produtora de eventos

"Para começo de conversa, ninguém dá credibilidade. Quando tô namorando homem, dizem que sou hétero. Quando tô namorando mulher, acham que sou lésbica. Estou namorando uma mulher atualmente e, no trabalho, não aceitam minha opinião sobre um homem ser bonito ou não, dizem que não posso opinar porque 'nem gosto direito disso'. Eu tento fazê-los entender, mas as pessoas meio que se recusam a entender que é possível que eu sinta atração pelos dois sexos. E quando 'entendem' acham que preciso estar necessariamente com os dois ao mesmo tempo para ser bi. Associam muito a relacionamento não-monogâmico, não entendem que é tão somente atração pelos dois sexos, não necessariamente o que eu vá fazer com essa atração." Andressa, 22, estudante de Medicina Veterinária

"Ouço sempre: 'Ficou assim depois que terminou seu noivado, né?' Respondo que sempre gostei de ficar com mulheres. Quando terminei só assumi isso porque a atração aumentou. Também é muito comum no meio lésbico o famoso: 'Você é bi porque não sabe o que quer'. Pra esse tipo de frase eu só dou minhas sinceras reviradas de olhos. Eu particularmente não gosto de me rotular. Hoje só fico com mulheres e dificilmente sinto atração por homens. Quando sinto, o encanto acaba quando abrem a boca. Prefiro dizer que gosto de pessoas e me relaciono com elas." Fernanda, 27, consultora de negócios

"Sempre fazem aquelas perguntas: você tem preferência por homens ou mulheres? Qual você escolheria pra namorar? Pra responder eu procurava ler sobre o assunto, até pra tirar dúvidas pessoais mesmo e conhecer melhor esse universo, entender meus sentimentos em relação à minha sexualidade. Não tenho preferência por um único sexo, eu posso gostar de ambos. Eu me perguntava se isso era apenas uma fase e se iria passar algum dia, até eu entender que não é uma fase,  é assim que eu sou, essa é minha natureza." Amerson, 28, estudante de Educação Física

"Eu mesma não tinha certeza, mas desde que meu casamento começou a querer acabar, voltei a ficar com caras. E aí o comentário deles é: 'Pô, bacana! Tenho uma amiga que também é. Algum dia a gente podia sair os três pra uma cerveja, né?' E aí eu respondo que só curto 'mina' menos feminina que eu. E perceba o tanto que eu não sou, cê topa?! E o comentário básico das meninas é: 'Nossa! Caras? Por quê???' Ao que eu respondo que apesar de tudo que escuto e leio, nunca tive nenhum relacionamento abusivo com um cara. E namorei caras até os 21. Com meninas, tive dois. Um deles, um casamento. Sorrio e saio de perto deixando a menina fazendo as contas." Samantha, 36, animadora

O que define a bissexualidade?

Para a psicóloga e coach LGBT Fernanda Fonseca, no período de autodescoberta cada pessoa passa por um processo diferente: "Sofremos pressões da sociedade e das pessoas que nos cercam. Temos que lidar com as nossas próprias expectativas e as expectativas alheias. É válido lembrar que o que faz de alguém ser bissexual não é ter relações sexuais com ambos os sexos, mas sim sentir atração sexual por homem e mulher."

"As pessoas fazem aquela pergunta clássica: 'Quando você transa com uma mulher não sente falta de pau?' Não, minha gente! Sexo vai muito além de penetração. Ouvi muito que bissexuais não são confiáveis e que provavelmente vão trair seu parceiro ou sua parceira porque vão sentir falta do outro sexo. Essa é a maior babaquice de todas, preconceito. Bissexuais traem assim como héteros ou homossexuais, porque isso está ligado ao caráter da pessoa, não à sexualidade." Andressa, 21, estudante de Publicidade e Propaganda

"Me perguntam muito se eu gosto mais de homens e menos de mulheres. Já passei por muitas situações, fiz até tomografia pra tirar a dúvida e não havia nenhuma anormalidade. Sempre escondi da família, que é conservadora demais, e dos amigos do bairro. Admiro e respeito as mulheres, elas me atraem, mas tenho mais desejo e prazer com homens." Aloisio, 35, carteiro

Metade da população mundial pode ser bissexual

É o que a psicóloga Fernanda Fonseca explica: "Estudos sobre a sexualidade humana já demonstraram que há mais bissexuais do que imaginávamos, algumas teorias chegam a dizer que cerca de 50% das pessoas são bissexuais. Não há nada de errado em ser bissexual. Ao contrário do que muitos pensam, a pessoa bissexual não está em uma fase, nem é infiel, promíscua ou indecisa devido a sua afetividade. A bissexualidade é apenas uma parte da identidade da pessoa, é a sua orientação sexual (e não opção sexual), assim como a heterossexualidade e outras."

Fernanda Fonseca é psicóloga e coach LGBT (http://luxlgbt.com.br)

Sobre a autora

Ana Angélica Martins Marques, a Morango, é mineira de Uberlândia, jornalista, fotógrafa e DJ. É também autora do livro de contos Quebrando o Aquário. Passou pela décima edição do Big Brother Brasil e só foi eliminada porque transformou o temido quarto branco no maior cabaré que você respeita. É vegetariana e cuida de três filhos felinos: Lua, Dylan e Mike.

Sobre o blog

Um espaço para falar de amor, sexo, comportamento feminino e feminismo com leveza e humor. Tudo sob o olhar de uma mulher esperta, que gosta de mulheres tão espertas quanto ela!