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O "black Twitter" e a revolução da representatividade negra

Angélica Morango

26/06/2018 11h46

A fotógrafa paulistana Tauany Almeida (Foto: Instagram/Ton Gomes)

Em uma de suas redes sociais a fotógrafa Tauany Almeida fala, sem papas na língua, de sua rotina, sexualidade, e rebate ofensas racistas e misóginas. "Falo coisas óbvias, mas de um jeito engraçado – pra mim, pelo menos. Com isso as pessoas se identificam e aí é aquilo, né? Uma pessoa gosta, a outra retuíta e assim vai", conta.

"Feminismo branco não me contempla", "Dando unfollow em quem diz que Jay-Z é feio", "Minha mãe invade minha privacidade, lê coisas que não deveria e ainda fica brava" são algumas das postagens que ela intercala com fotos pessoais que recebem milhares de curtidas e comentários – nem sempre positivos. Até aqui, tudo bem comum à maioria dos jovens de 20 e poucos anos na internet, certo? Acontece que é assim que uma verdadeira revolução está acontecendo.

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"Black Twitter"

"O 'black Twitter' meio que aconteceu sem uma intenção. Eram só pessoas negras seguindo pessoas negras. Eu entrei no Twitter em 2010, e na época eu só seguia quem eu conhecia pessoalmente, mas há uns dois anos comecei a seguir mais pessoas negras de diversos lugares porque os tuítes dessas pessoas sobre negritude apareciam na minha timeline. E acabou que virou um grande 'clubinho'", resume Aretha Soyombo, estudante de Letras da UFMG.

"Eu gosto desse 'black Twitter' porque confesso que minha autoestima e minha confiança como mulher negra aumentou bastante. Ver outras meninas negras lá se sentindo super bem consigo mesmas me fez sentir pertencente a um grupo. Me fez pensar 'também posso ser bonita assim'", revela Aretha, de 22 anos (Foto: Reprodução/Instagram)

"Quando eu tinha 14 anos eu assinava a Capricho e, sem dúvida nenhuma, aquela revista não era pra mim. Lembro de uma matéria que me marcou muito que era 'Como ter o liso perfeito'. Eu nunca vou ter o liso perfeito, sabe?! E hoje eu sinto que por mais que às vezes pareça uma obrigação, ou porque a representatividade de todas as minorias esteja na moda, eu sinto que aumentou muito! E isso é muito importante porque a minha prima de 11 anos cresce se vendo mais na mídia. Mais do que eu me via", comemora Aretha.

Da direita para a esquerda Aretha, a prima Laura, de 11 anos, a irmã Agatha e sua mãe, Cláudia  (Foto: Reprodução/Instagram)

A revolução

Não é apenas no Twitter, que possui mais de 40 milhões de usuários só no Brasil, que essa revolução fundamentada na representatividade acontece. No Instagram, rede social com mais de 50 milhões de brasileiros conectados, também. "As coisas estão mudando, principalmente depois que a internet começou a abordar e a pressionar essas questões, já que ela tem funcionado como uma praça pública", expõe a carioca Andressa Vasconcelos, assessora de marketing digital, que utiliza a rede de compartilhamento de fotos para se posicionar politicamente.

"Quando tatuei 'Black Power' na costela muita gente perguntou se seria por conta do meu cabelo e a resposta é não! (…) O Black Power Movement foi um movimento político iniciado nos anos 1960, por Stokely Carmichael, e falava sobre a independência preta total, um rompimento com tudo o que nos prendia ainda como 'escravizados' em terras colonizadas", legendou Andressa ao publicar a foto em uma de suas redes sociais. (Imagem: Reprodução/Instagram)

Preconceito nas redes e nas ruas

Um dos assuntos mais debatidos nas redes é o preconceito: "Acho que todas as ativistas pretas e até mesmo quem não tem nenhuma ligação com o ativismo, mas é ativo nas redes sociais passa por isso. Passei e ainda passo, na verdade. Hoje me acostumei com os xingamentos e com ataques racistas, mas passei a ignorar, o que não é positivo", pondera Andressa.

"Pra mim o desafio atual é não entrar nos estereótipos de ser a negra barraqueira ou  a mulher negra que tem bundão, por exemplo", responde Tauany sobre o maior desafio da atual geração de mulheres jovens e negras nas redes sociais (Foto: Reprodução/Twitter)

"O preconceito é muito grande nas redes sociais. Na rua é uma coisa mais velada. A pessoa olha feio, às vezes rola uns gritos do nada como 'seu cabelo é duro' e coisas do tipo, mas na internet é bem pior", reforça Tauany, que critica o "racismo reverso", que é a ideia de que há racismo de negros contra brancos: "A questão não é acharem ofensivo, é que querem comparar a uma opressão que os negros sofrem desde a escravidão e que tem impacto ainda hoje. Acham que ser chamado de branquinho é equivalente a ser chamado de macaco, por exemplo, entre outras ofensas racistas".

Preta ou negra? "O racismo está na conotação"

"Alguns militantes se posicionam falando 'mulheres pretas' ou 'homens pretos', outros 'negros' e 'negras', mas não há uma diferença real. A diferença é a conotação que pessoas brancas colocam nisso… Como se preto fosse errado ou o ser preto fosse pecado", sintetiza Andressa sobre a questão que, definitivamente, não se encerra aqui. (Foto: Reprodução/Instagram)

Sobre a autora

Ana Angélica Martins Marques, a Morango, é mineira de Uberlândia, jornalista, fotógrafa e DJ. É também autora do livro de contos Quebrando o Aquário. Passou pela décima edição do Big Brother Brasil e só foi eliminada porque transformou o temido quarto branco no maior cabaré que você respeita. É vegetariana e cuida de três filhos felinos: Lua, Dylan e Mike.

Sobre o blog

Um espaço para falar de amor, sexo, comportamento feminino e feminismo com leveza e humor. Tudo sob o olhar de uma mulher esperta, que gosta de mulheres tão espertas quanto ela!