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"Quero sair do armário, por onde começo?"

Universa

06/02/2018 05h00


Falar abertamente sobre esse assunto é libertador (Orlando/Arte UOL)

"Gosto de mulheres, mas venho de uma família tradicional. Muitas tias são evangélicas e meus tios são super preconceituosos e fazem piadinhas sem graça sobre gays. Só minha mãe sabe da minha orientação sexual. Estou cansada de me esconder. Quero abrir o jogo para o meu pai e minha irmã, mas meu pai é daqueles que não usa camisa rosa porque 'é coisa de gay'. Tinha uma namorada, mas ela terminou comigo por não aguentar essa situação. Tenho muitos amigos, mas poucos sabem sobre a minha homossexualidade; os poucos que sabem não mudaram comigo, mas sei que vou perder alguns para o preconceito. O que eu faço?"

Essa foi a mensagem que recebi da T. pelo Instagram, e se você não é heterossexual certamente já viveu –ou ainda vive– a mesma angústia. Falar abertamente sobre esse assunto é libertador, mas o exercício dessa liberdade é uma tarefa diária e não é um caminho coberto de flores.

Vez ou outra lido com um olhar desaprovador, ouço que por ser lésbica sou "um desperdício" e recebo propostas para "o dia em que quiser mudar de ideia".

Quando, aos 16 anos, abri o jogo sobre minha sexualidade pra minha mãe e meu irmão, senti um alívio equivalente a tirar uma tonelada de peso das costas. O que não significou o fim de alguns problemas. Foi só um começo, e sempre é.

Minha mãe que, na hora encarou a notícia com a calma de quem escutou que comprei um pão na padaria, surtou depois. Meu pai, para quem falei sobre isso só aos 23, não foi diferente. Tenho amigos que, quando eram adolescentes, revelaram-se e não sofreram a fase de negação das famílias – que aceitaram e acolheram com naturalidade entendendo que essa não é uma escolha, mas uma condição –; e conheço pessoas que hoje, aos 30 e 40 anos, mesmo financeiramente independentes e em relacionamentos estáveis, sempre evitaram tocar no assunto –o que também é uma possibilidade e um direito.

Sair do armário não é só um ato privado, mas social. Quando revelamos algo tão íntimo sobre nós aos que nos são próximos e queridos, derrubamos os muros de mentiras e omissões que infelizmente erguemos por temor ou necessidade, e plantamos as sementes para um mundo mais tolerante e sensível.

Saí do armário porque estava cansada de "fazer a linha", ou seja, dizer para a família que um colega gay era meu namorado. Estava exausta de sair pra curtir uma balada LGBT com pânico de ser vista e "descoberta". Eu me assumi lésbica porque não aguentava mais apresentar uma namorada apenas como melhor amiga. Não suportava mais o medo de dar um beijo na rua e me sentir uma criminosa.

Preconceito é um conceito formado antecipadamente e sem fundamento, ou seja, uma ideia sobre o que não se conhece bem. Ao expor quem somos, contribuímos para a quebra dessas noções preconcebidas. A partir daí, seremos amados ou não pelo nosso temperamento, caráter, humor e outras características, que podem realmente fazer alguma diferença na vida das outras pessoas.

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Sobre a autora

Ana Angélica Martins Marques, a Morango, é mineira de Uberlândia, jornalista, fotógrafa e DJ. É também autora do livro de contos Quebrando o Aquário. Passou pela décima edição do Big Brother Brasil e só foi eliminada porque transformou o temido quarto branco no maior cabaré que você respeita. É vegetariana e cuida de três filhos felinos: Lua, Dylan e Mike.

Sobre o blog

Um espaço para falar de amor, sexo, comportamento feminino e feminismo com leveza e humor. Tudo sob o olhar de uma mulher esperta, que gosta de mulheres tão espertas quanto ela!