Topo

Morango

Sexo machista: será que você já fez?

Universa

29/12/2018 04h00

"Identifiquei quando comecei a me sentir usada, me sentir uma máquina de prazer para ela", conta Thammy (Foto: Reprodução/Instagram)

Uns dias atrás me perguntaram se eu já tinha feito "sexo machista", e eu levei alguns minutos pensando sobre o assunto pra responder. O que seria sexo machista? Mais violento? Dominador? Será que já fiz?

Comecei a minha vida sexual (a long time ago) com uma certa noção do que estava fazendo – ou pelo menos achava que sim. Perder a virgindade não foi nenhum bicho de sete cabeças, foi o que eu imaginei que seria: camisinha, ele por cima, uma dorzinha, um sanguinho… Depois rolaram outras posições, nenhuma dor, orgasmos, outros namorados… Tudo ok, mas eu sentia atração por mulheres. Desde sempre. Dois anos depois, quando fui pra cama com uma pela primeira vez, foi incrível. O toque, a pele, o perfume, tudo era completamente diferente. E, pra mim, muito melhor.

Mas enfim, fiz ou não fiz sexo machista? Revisitando meu passado libidinoso, cheguei à conclusão de que não. Nem com homens, nem com mulheres. Nunca me senti constrangida, obrigada ou impulsionada a fazer algo contra a minha vontade – e acredito nunca ter impelido ninguém a fazer o que não quisesse.

Sexo machista: como identificar

Conversando com outras mulheres, hétero, bi e homossexuais, descobri que, infelizmente, o sexo machista está mais presente nas relações do que eu imaginava. A boa notícia: é fácil identificar e mudar o padrão de comportamento.

"Tive namoros em que a pessoa se comportava assim (de um jeito impositivo) o tempo todo, e eu fui perdendo a vontade. Identifiquei quando comecei a me sentir usada, me sentir uma máquina de prazer para ela", conta Thammy, de 28 anos, explicando que alguns sinais do machismo no sexo são "não se preocupar se a parceira está molhada e já ir 'encarando'; não perguntar em nenhum momento ela está gostando do que está rolando e, mesmo sabendo que ela não gosta de uma determinada posição, falar coisas do tipo 'ah, mas faz por mim'".

"Notei minhas atitudes machistas quando estava procurando o sexo, somente, sem me importar se ela estava disposta, se gostava, se queria." (Foto: Reprodução/Instagram)

"Quando você percebe que é feito inconscientemente, vale a pena tentar uma conversa. Quando que você nota que o machismo é consciente, larga! Eu larguei. Por outro lado, notei minhas atitudes machistas quando estava procurando o sexo, somente, sem me importar se ela estava disposta, se gostava, se queria. Tenho isso como atitude machista, querer a carne sem pensar na alma", completa Thammy.

Bruna, 27, também já viveu uma experiência desse tipo na cama: "Esse ano fiz um sexo que considero totalmente machista, mesmo porque ele não esteve em momento algum preocupado se eu estava sentindo prazer ou não. Saímos pra realizar uma curiosidade dos dois, mas não acabou muito bem pra mim. Hoje em dia não faço mais, estou bem solteira", reflete.

"Tudo que assistimos exerce alguma influência sobre nós", adverte a psicóloga Fernanda Fonseca

Fernanda afirma que o sexo machista é projetado pela indústria pornô. "Os filmes pornográficos, em sua maioria, são voltados para o prazer masculino. Tudo que assistimos exerce alguma influência sobre nós, e os filmes podem tanto excitar quanto prejudicar. Prejudicam porque são muito ilusórios, têm muitos efeitos especiais, com isso podem sabotar a capacidade de sentir prazer com o real, porque criam um padrão irreal. E também podem dessensibilizar para questões relacionadas ao machismo – há muitos filmes que mostram que a mulher tem mais é que ser pega à força, que ela gosta e ainda pede por isso."

"Tentávamos nos encaixar em um 'padrão', sem sequer pensar se era isso mesmo que queríamos", lembra Bárbara (Foto: Arquivo Pessoal)

Bárbara, 24, e a namorada, de 27, estão juntas há cinco anos e, apenas recentemente, se deram conta da influência dos filmes eróticos na vida sexual delas. "Começamos a discutir o assunto porque nos vídeos pornôs quase sempre rola uma pica, um vibrador… Não que essas coisas sejam ruins, mas mulheres podem muito bem fazer sexo sem nada disso. Reproduzimos esse sexo dos vídeos sempre seguindo o 'script': dá beijo, desce para os seios, faz um oral e bora para a penetração! O auge do sexo era a penetração, fosse com os dedos ou com o pênis com a cinta. Tentávamos nos encaixar em um 'padrão', sem sequer pensar se era isso mesmo que queríamos. Desde então não transamos mais, porque sem o script do sexo 'normal', 'machista', 'falocêntrico' (mesmo que seja de borracha), não sabemos o que fazer. Mas estamos no processo de aprender coisas novas."

Para a psicóloga, é importante liberar as fantasias "elas costumam ser até curativas", incentiva. "Sair censurando tudo também não dá. Acredito que desde que dê prazer, tem mais é que viver." E ela dá dicas para substituir os "pornôs ruins" por experiências melhores:

* Procure na internet. Hoje em dia existem muitas opções de pornôs. Experimente, por exemplo, assistir a filmes pornográficos feministas (isso não é pornô 'leve', ou lésbico, mas um pornô que considera o prazer feminino tanto quanto o masculino). Prefira filmes pornográficos com pessoas comuns (e com defeitos) fazendo sexo, e não estrelas em seus melhores ângulos. As mulheres estão cansadas de tentar atingir esses padrões.

* Opte por filmes que demonstrem certa troca de afeto (não entenda isso como romantismo, mas troca de afeto em geral), e não que mostrem o homem como se fosse um animal que não tem limites e nem controle sobre seus próprios desejos.

* Substitua filmes pornôs por revistas. Revistas por histórias eróticas. Histórias eróticas por sua própria imaginação e criatividade. Se masturbe sem nenhum outro estímulo, usando apenas a sua percepção, para conhecer mais o seu próprio corpo. Se tiver um(a) parceiro(a), tente sempre descobrir (pergunte!) o que mais lhe agrada e lhe dá prazer.

Fernanda Fonseca é psicóloga e coach LGBT

Leia também:

Por que eu odeio pornô lésbico (e o que não aprendi em filme de sacanagem)

O que nunca dizer na cama – e, assim, evitar uma broxada

Os 9 filmes lésbicos que vão mexer com os seus conceitos

 

Sobre a autora

Ana Angélica Martins Marques, a Morango, é mineira de Uberlândia, jornalista, fotógrafa e DJ. É também autora do livro de contos Quebrando o Aquário. Passou pela décima edição do Big Brother Brasil e só foi eliminada porque transformou o temido quarto branco no maior cabaré que você respeita. É vegetariana e cuida de três filhos felinos: Lua, Dylan e Mike.

Sobre o blog

Um espaço para falar de amor, sexo, comportamento feminino e feminismo com leveza e humor. Tudo sob o olhar de uma mulher esperta, que gosta de mulheres tão espertas quanto ela!