Ângela e Willman, juntas há 25 anos: “A gente não tem o que esconder”
"Sempre fui uma menina muito pacata. Com meus 15, 16 anos, eu não era muito de sair, de ir pra bailinho. Tive até a intenção de ir para um convento, mas minha mãe não deixou. Aos 17, tive meu primeiro namoradinho, mas nunca me apaixonei. Era um namoro meio diferente, eu não gostava que ele me tocasse. Eu era bem diferente mesmo", recorda Ângela Fontes, de 68 anos.
"O que tá acontecendo com a gente?"
Auxiliar de enfermagem aposentada, Ângela conta que, durante a juventude, apesar de se sentir diferente das outras meninas, não tinha informações ou referências sobre sua sexualidade.
"Nunca tinha ouvido falar. Nem em novela, nem algum artista, e nem tinha amigas lésbicas. De vez em quando, via a minha irmã comentar que tinha mulher que era 'mulher-macho', mas eu não entendia o por quê. Ela falava que 'mulher-macho' era mulher que gostava de mulher. Na primeira vez em que fiquei com uma amiga, nós nos perguntamos 'o que tá acontecendo com a gente?'"
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Esse primeiro beijo, numa colega de trabalho, só aconteceu aos 22 anos idade. E foi cercado de conflitos. "Eu era da Igreja Católica, ela também. Inclusive, ela tem um padre e duas freiras na família. A gente até tentou se separar, mas não teve jeito. Uma sentia falta da outra e a gente começou a sair novamente, como amigas. Depois foi acontecendo naturalmente", revela.
Preconceito velado
"Naquela época, como tinha um preconceito muito velado, a gente não podia nem pensar em falar pra alguém. As coisas eram tão complicadas que nunca saíamos juntas pra trabalhar, nem pra passear. Eu saía com o carro e pegava ela depois de um quilômetro de distância do apartamento em que morávamos juntas, pra que ninguém do condomínio desconfiasse que vivíamos uma vida de casal", entrega Ângela, sobre seu primeiro relacionamento.
Quando o primeiro amor, de descobertas, chegou ao fim, o destino fez com que os caminhos de Ângela e de Willman, que tinham sido colegas de trabalho há alguns anos, se cruzassem novamente. Desde então, há duas décadas e meia, as duas não se deixaram mais.
Wilmann: "Fui casada por 19 anos com um homem"
"Fui casada com um homem por 19 anos. Tenho duas filhas e uma neta, que é nossa paixão. Pras minhas filhas, Ângela é uma mãe. Minha neta chama ela de vó", conta Willman Rocha, 73, auxiliar de enfermagem aposentada.
Visibilidade Lésbica
No Mês da Visibilidade Lésbica, marcado pela luta de ativistas que promoveram o Primeiro Seminário Nacional de Lésbicas, o Senale, em 29 de agosto 1996, histórias como as de Ângela e Willman merecem ser celebradas.
"Quando você se descobre lésbica, você entra em conflito consigo mesma. Mas quando você descobre que é aquilo que você quer, que a sua sexualidade é aquela, você se sente feliz. Hoje não tenho mais medo de nada. Tenho um grande amor há 25 anos e acho que será para sempre, até que um dia nos separaremos pra virar estrelinha. Eu me orgulho muito de ser lésbica", declara Ângela.
"Eu me sinto feliz em ser lésbica. Não fui feliz no casamento, com meu ex-marido, mas com a Ângela me sinto realizada em todos os momentos da minha vida. Eu me senti outra mulher", derrete-se Willman.
Eternamente Sou
O casal integra a Eternamente Sou, uma ONG que desde 2017 promove eventos socioculturais e atividades de integração de idosos LGBTs na capital paulista.
"O Eternamente veio pra que a gente jogasse esse cadeado do armário fora e não pusesse jamais. Agora nós somos duas senhoras que passeiam na Avenida Paulista de mãos dadas e nos damos beijos, se estamos entre amigos. Não temos mais aquele medo do que vão falar ou vão deixar de falar. Na Parada do Orgulho do ano passado, com o grupo do Eternamente, fomos mais fotografados que o pessoal dos trios, porque saímos com as plaquinhas dos idosos. Tinha tanto jovem que vinha nos cumprimentar pela postura, por estar lá lutando por tudo o que a gente merece", orgulha-se Ângela.
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