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Dominadora lésbica e submissa pansexual: elas são BDSMers LGBTQI+

Universa

10/07/2019 04h00

"Um dos principais conceitos para se definir o BDSM é a hierarquia, e, como base o SSC: são, seguro e consensual", explica Artemis, 29, dominadora e consultora de BDSM (Foto: Arquivo Pessoal)

Umas ordens na cama, uns tapinhas na bunda, um par de algemas e pronto! Durante anos, essa era a ideia que eu tinha sobre o BDSM, algo como um jogo erótico em que se brinca com chicotes, máscaras e roupas de couro ou de látex. Eu não podia estar mais errada. Adoro o assunto, mas não passo de uma "baunilha", que é como os BDSMers se referem a quem não é do meio. Para entender o conceito, é preciso ter a mente aberta às relações verticais, bem diferentes daquelas a que nos habituamos. Há sempre um dominador e um submisso, e há quem ora se identifique mais com um comportamento, ora com outro, os switchers. Existe uma hierarquia clara e as ordens não se limitam ao quarto ou às sessões (onde não necessariamente rola sexo) – os comandos podem se estender a diversos aspectos da vida, incluindo decisões familiares e profissionais. O limite é o consenso entre as partes, LGBTQI+ ou não.

Artemis, dominadora lésbica

"Sempre tive um aspecto dominante em todas as minhas relações sexuais e amorosas. Quando tive conhecimento do BDSM, pensei: 'é isso! Sou eu!'. Essa descoberta aconteceu por volta dos 20 anos, quando me relacionei com uma bottom (submissa). Ela viu em mim um perfil dominante, falou a respeito desse universo e eu comecei a estudá-lo. Embora o BDSM não tenha me feito dominadora, posso dizer que ele lapidou em mim esse lado, trazendo discernimento e consciência para exercer a dominação de forma saudável e não abusiva", conta Artemis, de 29 anos, que é lésbica e dominadora.

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BDSMers: "são pessoas fazendo o que gostam, ocupando posições que consideram satisfatórias"

Artemis, que é publicitária e consultora de BDSM, explica que o que diferencia o abuso da dominação é a motivação de ambos. "Dominadores, quando exercem poder sobre suas posses, nunca o fazem com motivações egoístas. O submisso serve o dono no que tange as necessidades diárias e mais imediatas; enquanto o dominador guia, cuida e guarda. Pessoas abusivas tendem a depreciar e diminuir os parceiros por motivações egoístas. Quem leva o BDSM como estilo de vida costuma ser muito sincero sobre o que gosta, o que faz e como faz. São apenas duas ou mais pessoas fazendo o que gostam e ocupando posições que consideram satisfatórias."

Máscaras e outros acessórios podem fazer parte das sessões de BDSM (Foto: Artemis/Arquivo Pessoal)

Relações verticais

"Quando está em um relacionamento, como se refere à sua namorada?", pergunto a Artemis, sobre a dinâmica das relações BDSM entre mulheres lésbicas. "Para responder, acho que seria bacana definir casamento e namoro. Quando penso nesses dois, imagino relações horizontais, onde ambos exercem sua liberdade de ir e vir em todos os aspectos, e não há transferência de poder no que tange a relação como um todo (fora do quarto, por assim dizer). Mas se aqui você está falando sobre envolver sentimento e morar junto, ok… BDSMers fazem isso. Se apaixonar e querer estreitar contato é algo que pode atingir qualquer um. Mas na dinâmica entre dominantes e submissos, as relações são pautadas em poder, verticalidade, possuir e pertencer. Se envolver amor, a chamo de 'amor', 'linda'… Mas de 'namorada', apenas diante de algum baunilha que desconheça o tipo de relação que temos… Ficaria muito complicado tentar explicar tudo a alguém. Mas a sub vai me chamar como eu quiser e deixar que ela me chame. Por exemplo, pode ser 'amor', pode ser 'Senhora', 'Dona'… depende do momento."

Palavra de submissa

"A relação boa tende a ser espontânea, sem teatros ou aquela sensação de 'pisar em ovos'. É maravilhoso quando a hierarquia está tão inserida que torna 'natural' e carinhoso o uso dos pronomes que validam e expõem a verticalidade", relata Patrícia Teixeira, que é uma mulher trans, pansexual e BDSMer desde os 18 anos de idade. Enquanto conversávamos, comentei sobre a Artemis, que não estava presente, e ela se referiu à dominadora como "Senhora", o que me intrigou. "O BDSM tem protocolos, regras, cerimônias. Dentre os protocolos, é considerado de bom tom que quem está abaixo na hierarquia chame quem está acima de Senhor ou Senhora; e seus iguais, ou quem está abaixo na hierarquia, pelo nome ou apelido."

"Sempre me senti extremamente confortável com um relacionamento de poder desigual, um relacionamento onde meu (minha) parceirx tem mais poder que eu. Poder este que eu atribuo, que consinto de forma consciente, por entender todas as consequências deste tipo de relacionamento", expõe Patrícia (Foto: Arquivo Pessoal)

"Sou submissa desde que entrei na comunidade. Traços que formam minha personalidade fazem com que eu tenha um fetiche pelo poder. Adoro servir, atender, ouvir, ajudar, e sempre que tenho a oportunidade de me colocar em uma posição erótica de humildade eu me coloco porque eu amo sentir o poder da outra pessoa, a altivez, a inteligência, a determinação", entrega.

"Relações BDSM passam por algumas etapas bem práticas"

"As pessoas se conhecem e se sentem atraídas, como em qualquer relacionamento. Quando decidem ter algo mais sério, mesmo que seja uma única sessão, elas entram em um estágio chamado por nós de 'negociação'", revela Patrícia. "Durante a negociação as pessoas conversam, se entendem, falam o que suportam o que não suportam (limites), contam seus desejos etc. O grau de profundidade da negociação vai depender da relação que está sendo construída. Por exemplo, se os envolvidos querem fazer uma sessão com velas, onde um irá causar dor no outro pingando cera quente (de uma vela adequada para a situação e com técnicas para evitar queimaduras), a conversa é mais simples. Agora, se querem uma relação contínua, com alta troca de poder, então a conversa tem que ser muito mais profunda, vai envolver muito mais itens. Negociações assim podem demorar meses para se consolidar. A relação ou sessão acontece e todos vivem felizes para sempre", brinca.

 

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Sobre a autora

Ana Angélica Martins Marques, a Morango, é mineira de Uberlândia, jornalista, fotógrafa e DJ. É também autora do livro de contos Quebrando o Aquário. Passou pela décima edição do Big Brother Brasil e só foi eliminada porque transformou o temido quarto branco no maior cabaré que você respeita. É vegetariana e cuida de três filhos felinos: Lua, Dylan e Mike.

Sobre o blog

Um espaço para falar de amor, sexo, comportamento feminino e feminismo com leveza e humor. Tudo sob o olhar de uma mulher esperta, que gosta de mulheres tão espertas quanto ela!