Eu, bissexual: "mulheres acham que sou hétero; homens, que sou lésbica"
Universa
18/01/2019 04h00
"Mulheres acham que eu sou hétero. Homens acham que eu sou lésbica. Confira o drama de ser bissexual hoje, no Globo Repórter", brincou a produtora audiovisual e social media Juliane Rodrigues, de 28 anos, em uma rede social. Bem humorada, ela aprendeu a usar essa característica para defender suas opiniões e orientação sexual. O que soa divertido agora, só aconteceu depois de um longo e tortuoso processo até a autoaceitação.
"Me assumi como lésbica aos 17 anos. Só me relacionava com mulheres e não havia me apaixonado por nenhum homem até os 23. Saí de um casamento com uma mulher e, quando notei, estava me sentido atraída por homens. No começo não aceitei de jeito nenhum, me convenci de que era 'heterossexualidade compulsória'. Foi engraçado. 'Não iluda o menino, Juliane', foi a primeira coisa que meu pai disse quando contei aos meus pais que estava gostando de ambos. Não foi fácil. A sociedade faz você pensar que tem que escolher entre um e outro sendo que, não, eu sou assim mesmo. Eu não escolho como um gay não escolhe e um hétero não escolhe. Não existe esse muro, não estou em cima dele, muito menos em dúvida", explica.
"A sociedade faz você pensar que tem que escolher entre um e outro sendo que, não, eu sou assim" (Foto: Reprodução/Instagram)
"Homens se aproximavam querendo uma mina pra dividir outra; mulheres se afastavam com medo de serem trocadas por homens"
Ela conta que, depois do primeiro namoro sério com um homem, começou a refletir sobre o passado e entendeu que desde a infância não sentia a necessidade de escolher entre homens ou mulheres, só não tinha se apaixonado por um ainda. "Quando assumi minha primeira relação com um cara foi pesado, eu comecei a entender os privilégios heterossexuais. Eu podia segurar a mão dele sem medo, mas ainda me continha por ter passado por várias situações de homofobia com mulheres. Eu não sou hétero quando estou com um homem, nem lésbica quando estou com uma mulher. Sigo sendo bissexual e existindo. Homens se aproximavam querendo uma mina pra dividir outra; mulheres se afastavam com medo de serem trocadas por homens. Foi difícil."
O diálogo, que bombou no Twitter de Juliane, aconteceu de verdade, no Tinder (Imagem: Reprodução/Twitter)
"Tenho mais opções, mas também mais chances de sofrer"
Apesar de manter a leveza diante das críticas, inclusive no próprio meio LGBT, a paulistana rebate. "Muitas pessoas tratam o B de LGBT como 'biscoito' ou 'bolacha', como se a gente estivesse ali só de 'enfeite'. A gente precisa de voz também. É doloroso quando a porrada vem do nosso lado porque no fim das contas só queremos sobreviver num mundo cheio de preconceito. Eu detesto a rivalidade entre lésbicas e bissexuais. Não é uma pauta que nos fortaleça, porque a homofobia segue sendo uma das coisas que mais nos mata. Quando estou com uma menina, sofro o mesmo risco que uma lésbica; quando não estou, sei do privilégio, mas sigo sendo hipersexualizada."
"Por aí ouvimos o termo 'bi de balada', que é horrível, mas que se entende como a pessoa heterossexual que hipersexualiza pessoas do mesmo sexo e não tem interesse real nelas. Essas pessoas não são bissexuais e não é legal que usem esse termo porque isso ofende quem realmente é. Bissexual gosta dos dois. Costumo falar que sinto atração por pessoas. Embora a aparência me atraia – não sou hipócrita – costumo observar mais do que isso já que, segundo os outros, tenho mais opções. Na verdade sinto que, por gostar dos dois sou mais crítica ainda, pois não encaro nenhum sexo como superior e sem falhas. E também tenho mais chances de sofrer – isso ninguém fala!"
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Censos oficiais e especialistas em sexualidade divergem quanto à estimativa da população LGBT no mundo – a teoria mais aceita é a de que 10% das pessoas se reconheçam lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros – o que, no nosso país, representa aproximadamente 20 milhões de brasileirxs.
"Sou bi?"
Juliane, que no Twitter tem mais de 50 mil seguidores e usa o espaço para conversar sobre o assunto, ora respondendo desaforos, ora esclarecendo dúvidas, simplifica a questão: "Algumas pessoas falam que, pra saber se é bi, você precisa se apaixonar pelos dois. Eu discordo. A primeira coisa que você tem que fazer é se permitir. Se aquilo te atrai e te faz questionar, já é uma chance. O que você tem que começar a pensar é: 'o que farei com isso?'. Assumir pra si mesmo é tão importante quanto pro mundo. Não é porque você experimentou que, pronto, é bissexual! Você precisa se sentir bem, querer mais, não de uma pessoa específica, mas falar 'eu gosto disso, eu sou feliz com isso'. É meio complexo no começo, mas depois você começa a ver com mais naturalidade. Só seja honesto com você, sempre, e faça o que te faz bem.".
Sobre a autora
Ana Angélica Martins Marques, a Morango, é mineira de Uberlândia, jornalista, fotógrafa e DJ. É também autora do livro de contos Quebrando o Aquário. Passou pela décima edição do Big Brother Brasil e só foi eliminada porque transformou o temido quarto branco no maior cabaré que você respeita. É vegetariana e cuida de três filhos felinos: Lua, Dylan e Mike.
Sobre o blog
Um espaço para falar de amor, sexo, comportamento feminino e feminismo com leveza e humor. Tudo sob o olhar de uma mulher esperta, que gosta de mulheres tão espertas quanto ela!